Em Algum Lugar nas Estrelas, Clare Vanderpool

“A Ausência é um estar em mim”, disse Carlos Drummond, certa vez. A mesma ausência é um dos protagonistas de Em Algum Lugar nas Estrelas. A ideia da não mais existência, como a perda de um parente, às vezes, se torna menos dolorida que a ausência por si só. Ausência significa desapego, desinteresse. E a indiferença é a mais cruel das relações humanas e, assim como em Drummond, está presente em Jack Baker.

Jack Baker é enviado para um internato pelo seu pai em outro estado. Isso logo após Jack perder a mãe. Longe de casa, sem amigos ou familiares e com a indiferença do pai, Jack tenta se habituar a sua nova realidade. No internato, no período pós guerra, ele conhece Early Auden, uma criança sensacional, e então se inicia uma grande amizade. No período de festas, a escola fica vazia e é quando os dois amigos têm suas melhores aventuras em busca do lendário Urso Apalache guiados pela constelação Ursa Maior. Nessas aventuras eles encontram várias criaturas fantásticas e têm um aprendizado sobre a morte.

Early é digno de nota e, francamente, não sei como não é o protagonista do livro. Early tem como principal hobby decifrar casas decimais de Pi, o número matemático sem fim. Além disso, o menino tem uma outra peculiaridade em relação às músicas que escuta: Louis Armstrong às segundas; Sinatra às quartas; Glenn Miller às sextas; Mozart aos domingos e Billie Holiday sempre que estiver chovendo. Todo esse comportamento estranho é, na verdade, claros indícios de que o menino tem Síndrome de Asperger, uma forma branda de autismo, embora a autora não deixe claro que ele tem, de fato, a condição.

Tratar de um assunto tão delicado que traz emotividade a tantas pessoas pode acabar sendo um tiro no pé. Não com Clare Vanderpool. A autora tem uma linguagem singela e delicada para apresentar os momentos, provocando, inevitavelmente, uma sensação acolhedora. Me fez lembrar o também excelente Passarinha, de Kathryn Erskine.

O principal apelo desse livro é o saudosismo. Ao ler Em Algum Lugar nas Estrelas, o leitor se sente em casa. É um ambiente criado de forma tão familiar e confortável que parar de ler causa um rompimento tão bruto que tudo que se quer é voltar para o livro. A obra não e uma simples história e possui muitos níveis de informação que podem levar diversos leitores a diferentes interpretações, mas todos terão o mesmo sentimento de saudade do livro logo após o seu fim. Esse é um daqueles para se ter na estante e guardar com carinho porque você vai ler de novo. Eu sei que vai. Eu mesmo estou em uma situação parecida com a de Jack e um dos inúmeros fragmentos de texto que destaquei me trouxe um tipo de abraço. Sério!

“Minha mãe era como areia. Do tipo que esquenta na praia quando você sai da água tremendo de frio. Do tipo que gruda no corpo, deixando uma impressão na pele para fazer você se lembrar de onde esteve e de onde veio. Do tipo que você continua achando nos sapatos e bolsos muito tempo depois de ter ido embora da praia.”

Entendem o que quero dizer?

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