Antes do Amanhecer, Richard Linklater





Dois jovens perdidos tentando se encontrar. No meio do caminho, topam um com o outro. Conforme caminham, cada um procura vencer suas incertezas, ou pelo menos conviver melhor com elas. Num trem que cruza a Europa estão os jovens Jesse e Celine e, ironicamente, é uma briga que acaba por uni-los.

Celine é uma garota francesa, e Jesse, um americano. No meio de uma viagem, eles se conhecem e começam a conversar. No dia seguinte, ambos voltarão para seus países de origem. Mas entre um dia e outro está a aventura amorosa deles. Nesse curto espaço de tempo está uma relação incomum, diferente. Uma relação que é a mistura de anseios juvenis que transmitem o "carpe diem" e preocupações com o futuro além daquele pequeno encontro. Assim então, num ímpeto de coragem, eles saltam do trem para passar um dia em Viena.
"...acho que a gente tem uma espécie de conexão."
Jesse é um rapaz que, apesar da máscara que o faz parecer insensível e cético sobre o amor, espera realmente encontrar alguém especial, mas sem todas as consequências que isso implica. Celine é uma garota criada por pais que vivenciaram o Maio de 68, e isso refletiu na sua educação e, consequentemente, em quem ela viria a se tornar. Independente, ela, assim como Jesse, possui fortes críticas ao padrão de relacionamento que ambos julgam insosso. Não se sabe se foram unidos pelo destino, por Deus ou até por uma coincidência. Isso não importa. O que importa é que estão ali e irão viver aquele momento, discutir o que poderá ser do futuro, mas, em primeiro lugar, aproveitar o momento.

O casal (se é que pode ser chamado assim) que está passeando por Viena não quer a promessa de uma relação duradoura, com direito a uma casa própria e dois filhos. Eles não querem cair na mesmice quase sempre presente em relacionamentos mais avançados. Eles nem teriam tempo para tanto, pois em algumas horas o castelo de cartas construído por eles irá desmoronar e precisarão voltar para seus lugares. Mas esse dia dá a eles a dimensão de uma vida. É o infinito dentro de um segundo. Assim como no poema escrito pelo mendigo vienense, Celine e Jesse são conduzidos pela vida como objetos sendo carregados rio abaixo. Nessa pequena jornada, um levará ao outro, e é exatamente essa troca igualitária que ambos procuram.

Não é possível considerar esse filme como romântico, tampouco como realista. A verdade é que ele está ali no meio, e oscila entre esses dois extremos. Ou, corrigindo a mim mesmo, o filme mostra que romantismo e realismo não são tão opostos assim. A premissa do filme é sobre a aventura de Celine e Jesse por algumas horas em Viena, e toda a história é uma grande conversa. Eles conversam sobre vida, morte, Deus e, principalmente, amor, e o que não é dito acaba por ser representado.

Os protagonistas Ethan Hawke e Julie Delpy possuem um entrosamento incrível, que traz leveza e naturalidade à história. Os olhares tímidos trocados entre o casal, os toques modestos e tudo o mais contribui para esse realismo. Com tanta intimidade, a câmera é quase como uma intrusa na história, e até parece a concretização da ideia maluca de Jesse de criar um reality show em que uma pessoa normal é acompanhada em suas atividades diárias. Através da conversação, um apreço vai sendo formado. No alto de uma roda-gigante, enquanto o sol se põe, surge o momento oportuno para o primeiro beijo. Mas não existe trilha-sonora, nem uma delicadeza maior no enquadramento da câmera. O primeiro beijo deles está ali de forma crua, assim como os sentimentos, e o diretor nos faz senti-los também sem o incentivo de uma música romântica.

Antes do Amanhecer é a síntese dos sentimentos humanos, desde a paixão no sentido mais puro até as incertezas e medos. Em meio a tantas explosões e correrias que predominam no cinema, Richard Linklater merece elogios por cativar o espectador com diálogos tão simples e valiosos e que demonstram a importância da linguagem e da comunicação, associando isso a belas imagens que desenham os sentimentos dos personagens quando as palavras não dão conta.. No fim, despedidas precisam ser feitas, e fica a quem assiste o gosto de "quero mais". Para terminar, aparecem imagens da Viena que foi palco de um intenso encontro de amor, mas sem mais os dois sonhadores, já que precisaram acordar e retornar à vida normal. O que sobra é a promessa do reencontro e a mostra de que, sim, o amor pode existir até mesmo num pequeno intervalo entre um dia e outro.

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